quarta-feira, 1 de julho de 2009

Momento literário: Os quatro amores CS Lewis


Os quatro amores - CS Lewis


Devido a outros afazeres, demorei um pouco para terminar a leitura deste livro, ele tem apenas 72 páginas, mas é muito complexo o assunto, demanda uma leitura muito calma e com várias consultas em outras fontes, já que além de filósofico é muito teológico.
O livro fala de quatro tipos de amor, são eles:

Introdução: Preferências e amor subumanos
Fala sobre amor-necessidade, coisas que criam vontades ou sentimentos momentâneos, o patriotismo e toda espécie de desencadeamento social que isso pode causar, tais como sentimento de superioridade, racismo, etc.
Fragmentos do livro:

1.Afeição

Os gregos davam a este amor o nome de storge (duas sílabas). Vou chamá-lo aqui simplesmente de Afeição. Meu léxico grego define storge como “Afeição”, especialmente a dos pais pelos filhos; mas também a dos filhos pelos pais. E essa, não tenho dúvidas, é a forma original da coisa assim como o significado essencial da palavra. A imagem inicial é a da mãe amamentando uma criança, uma cadela ou uma gata com uma cesta de filhotes; todos amontoados, empurrando-se e guinchando ou miando; lambidas, ronronar, tatibitate, leite, calor, o cheiro da vida jovem.

A importância desta imagem é que ela nos apresenta logo no princípio uma espécie de paradoxo. A Necessidade e o amor-Necessidade dos recém-nascidos são óbvios; assim também o amor-Doação da mãe. Ela dá vida, dá o alimento, dá proteção. Por outro lado ela deve dar à luz ou morrer.

Deve amamentar ou sofrer. Dessa forma, a sua Afeição é também um amor-Necessidade. Vemos aí o paradoxo. Trata-se de um amor-Necessidade, mas o que ele precisa é dar.
Trata-se de um amor-Doação, mas precisa ser necessitado.

2.Amizade

Poderia ser argumentado que as amizades têm valor prático para a comunidade. Toda religião civilizada teve início num pequeno grupo de amigos. A matemática de fato começou quando alguns amigos gregos se reuniram para falar sobre números, linhas e ângulos. O que é agora a Sociedade Real não passava originalmente de urna reunião de cavalheiros em suas horas de lazer a fim de discutir coisas de que eles (e não muitos outros) gostavam. O que chamamos agora de “Movimento Romântico” não passava antes das conversas incessantes dos Srs. Coleridge e Wordsworth sobre uma visão secreta só deles. O comunismo, o tractarianismo, o metodismo, o movimento antiescravista, a Reforma, a Renascença, poderiam ser ditos sem grandes exageros que nasceram da mesma maneira.

Você se torna amigo de alguém sem saber ou se preocupar se ele é casado ou solteiro ou como ganha a vida. O que todas essas “coisas desprezíveis e rotineiras” têm a ver com a pergunta real: “Você vê a mesma verdade?” Num círculo de amigos verdadeiros cada homem é simplesmente o que é: não representa nada além dele mesmo. Ninguém se importa absolutamente com a família, profissão, classe social, renda, raça ou história prévia do outro. Você irá naturalmente ficar sabendo sobre a maior parte dessas coisas no final, mas casualmente. Elas virão aos poucos, para fornecer um exemplo ou uma analogia, para servir de ganchos para uma anedota, mas nunca por si mesmas. Essa a realeza da amizade.

Trata-se de uma relação de mentes desembaraçadas ou despidas. Eros quer corpos nus, a Amizade personalidades nuas.


3.Eros

Usamos uma expressão idiomática infeliz quando dizemos a respeito de um homem sensual rondando as ruas que ele “quer uma mulher”. Num sentido rigoroso da idéia, uma mulher é justamente o que ele não quer. Ele deseja um prazer em que a mulher acontece ser a peça necessária. O quanto ele se preocupa com a mulher como tal pode ser medido pela sua atitude cinco minutos depois do prazer (ninguém guarda o maço de cigarros depois de tê-los fumado). Eros, por sua vez, faz com que o homem não deseje uma simples mulher, mas uma mulher especial. De algum modo misterioso mas indiscutível, o amante deseja a amada, ela mesma, e não o prazer que lhe pode proporcionar.

Veremos aqui repetido o mesmo padrão. Como Vênus em Eros não almeja realmente o prazer, também Eros não visa a felicidade. Podemos julgar que o faz, mas uma vez feito o teste o resultado é outro.
Todos sabem que é inútil tentar separar amantes provando que seu casamento será infeliz. Não só pelo fato de que não irão acreditar em suas palavras, pois mesmo que acreditassem não seriam dissuadidos. Quando Eros está em nós essa é justamente uma de suas marcas: preferimos ser infelizes com o ente amado a ser felizes em quaisquer outros termos.

Será que vamos nos manter nesse estado de liberdade altruísta a vida inteira? Talvez nem mesmo uma semana. Entre os melhores amantes esta condição é intermitente. O velho “eu” logo mostra não estar tão morto corno parecia como acontece depois de uma conversão religiosa. Em qualquer dos casos ele pode achar-se momentaneamente inconsciente, mas logo se levantará; se não ficar de pé, pelo menos se porá de joelhos; se não rugir, pelo menos vai voltar aos seus resmungos mal-humorados ou seus queixumes. E Vênus escorregará de volta à simples sexualidade.

4.Caridade

Não existe um investimento seguro. Amar é ser vulnerável. Ame qualquer coisa e seu coração irá certamente ser espremido e possivelmente partido. Se quiser ter a certeza de mantê-lo intacto, não deve dá-lo a ninguém, nem mesmo a um animal. Envolva-o cuidadosamente em passatempos e pequenos confortos, evite todos os envolvimentos, feche-o com segurança no esquife ou no caixão do seu egoísmo. Mas nesse esquife - seguro, sombrio, imóvel, sufocante - ele irá mudar. Não será quebrado, mas vai tornar-se inquebrável, impenetrável, irredimível.


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